Até 2008, a família declarava à Justiça Eleitoral bens em torno de R$ 1 milhão, o que incluía apenas 3 dos atuais 13 imóveis. As principais aquisições ocorreram nos últimos dez anos.
As duas principais casas do patrimônio de Bolsonaro ficam em um condomínio à beira-mar na Barra, na avenida Lúcio Costa, um dos pontos mais valorizados do Rio.
Segundo documentos oficiais, ele adquiriu uma por R$ 400 mil em 2009 e outra por R$ 500 mil em 2012.
Hoje o preço de mercado das duas juntas é de pelo menos R$ 5 milhões, de acordo com cinco escritórios imobiliários da região consultados pela Folha. Ou seja, teriam tido valorização de pelo menos 450% no período.
À época, a prefeitura já avaliava o preço das casas muito acima, no cálculo para o imposto de transmissão de bem. Para a de R$ 400 mil, R$ 1,06 milhão. Para a de R$ 500 mil, R$ 2,23 milhões.
Sem ser informado do caso específico, o presidente do Conselho Regional dos Corretores de Imóveis do Rio, Manoel Maia, afirmou que conhece o condomínio de Bolsonaro e que o preço das casas no local não teve variação significativa nos últimos oito anos. “Talvez não tenha valorizado quase nada.”
Já levantamento do Secovi-RJ (sindicato das empresas do ramo imobiliário) aponta que houve valorização, mas muito abaixo de 450% –alta de 63% de 2011 até agora.
SUSPEITA
As transações que resultaram na compra da casa em que Bolsonaro vive, na Barra, têm, em tese, indícios de uma operação suspeita de lavagem de dinheiro, segundo os critérios do Coaf (Ministério da Fazenda) e do Conselho Federal dos Corretores de Imóveis (Cofeci).
A Comunicativa-2003 Eventos, Promoções e Participações adquiriu a casa em setembro de 2008 por R$ 580 mil. A responsável pela empresa, Marta Xavier Maia, disse à Folha que comprou o imóvel num estado ruim, reformou-o e vendeu-o para o deputado quatro meses depois, com redução de 31%.
Ela afirmou que decidiu ter prejuízo porque precisava dos recursos para adquirir outro imóvel.
O Cofeci aponta que configura ter “sérios indícios” de lavagem de dinheiro operação na qual há “aparente aumento ou diminuição injustificada do valor do imóvel” e “cujo valor em contrato se mostre divergente da base de cálculo do ITBI”, o imposto cobrado pelas prefeituras. Desde 2014, operações do tipo devem ser comunicadas ao Coaf –a unidade que detecta operações irregulares no sistema financeiro.
No mercado, é comum a prática irregular de colocar na escritura valor abaixo do real, com o objetivo de driblar o imposto de lucro imobiliário. Desta forma, registra-se um valor de aquisição menor, com pagamento por fora. Outra intenção da fraude é fazer com que o comprador não oficialize um aumento patrimonial incompatível com seus vencimentos. O Coaf não se pronuncia sobre comunicações recebidas, por questões de sigilo legal.
O presidenciável recebe hoje salário bruto de R$ 33,7 mil como parlamentar (líquido de R$ 24 mil), além de soldo –segundo o Exército, um capitão da reserva na situação de Bolsonaro recebe cerca de R$ 5.600 brutos.
O valor real dos imóveis de toda a família –cinco em nome de Jair Bolsonaro, três de Carlos, dois de Eduardo e três de Flávio –representa cerca do triplo do que a família declarou à Justiça. Não há ilegalidade. A lei exige apenas o informe de bens.
OUTRO LADO
A Folha procurou Bolsonaro e seus três filhos desde a tarde de quinta-feira (4) e encaminhou 32 perguntas para as assessorias dos quatro.
Apenas as de Flávio e Carlos responderam, mas de forma genérica.
Flávio afirmou que estava em viagem ao exterior e que ficaria à disposição quando retornar ao Rio, dia 17.
A assessoria de Carlos disse que seu patrimônio é modesto e igual há vários anos.
A Folha enviou 13 questionamentos a Jair Bolsonaro, entre os quais se ele considera o patrimônio de sua família compatível com os ganhos de quem se dedica exclusivamente à política. O deputado não respondeu.
Em 2015, a Procuradoria-Geral da República recebeu uma denúncia questionando os valores informados por Bolsonaro em relação às suas duas casas da Barra.
Apenas tendo ouvido a defesa do presidenciável, o então procurador-geral, Rodrigo Janot, mandou arquivar o expediente dizendo que valores eram os mesmos do Imposto de Renda. Janot alegou se tratar de denúncia anônima sem “elementos indiciários mínimos” de ilícito.
A advogada Marta Maia, dona da empresa que vendeu com deságio a casa de Bolsonaro, negou irregularidades.
“Foi tudo feito com depósito em conta”, disse. Ela afirmou que revendeu o imóvel com prejuízo de R$ 180 mil porque tinha interesse em outro. “Meu negócio é esse. Pegar uma casa em condições ruins, reformar e revender.”